sábado, 28 de março de 2015

Assim se morre

 
Foto: Bjorn Oldsen
 
 
Anda comigo ver o mar

na alvorada do sentir.

como humanos

poderemos perder o pé.

Seremos oceano.

 

Ensaboo-me na tua voz.

Dissolvo-me nas tuas

mãos acesas.

Soletro devagar

as letras soltas

nas ondas do teu corpo.

 

És um mapa astral.

Não são precisas estrelas.

Leio-te em braille.

Estou cega por ti.

Bordas nos meus lábios

o que a língua diz

e no silêncio da rima

surge a poesia.

 

Meu rio cristalino,

escuta na concha

o meu grito de maresia.

Enlaça a água.

Falo em mim.

Falo em nós.

Assim se morre

no sitio certo.


sábado, 21 de março de 2015

Liberdade presa


 
 
Foto: Stanmarek
 
 
 
Cresce a nudez.

Sinto-me pura.

Venho com a brisa.

Mato a sede.

As mãos seguem o Fado

e descobrem a Pedra Filosofal:

o poder dos sentidos.

 

És perfeito em mim,

quando soltas

os versos mortos

que ainda não escrevi com a língua

na folha aberta

dos teus lábios.

 

Solto murmúrios molhados

de um segredo

profundo

e assim concedo o poder

 de ouvir o bater

orgásmico do coração.

 

Violamos as Palavras.

Roubamos os segredos carnais.

Atentamos ao pudor.

Matamos o desejo.

 

Seremos presos.

Nunca te livrarás de mim.

Assim tem de ser.

 

domingo, 15 de março de 2015

O grito


 
 
Poupa energia.

Descobre a lua curvilínea

do meu seio.

Funde as estrelas.

Há a energia renovável

com o movimento corporal

no horizonte

vertical.

 

Tudo se torna descartável.

O que nos cobre

fica espalhado pelo céu.

A cada toque

reciclas o meu corpo.

Levas-me o eco

(ao) ponto certo.

G(emo).

 

Sem erros

nem acordos,

decompomos a

língua em verso.

Abres o livro

que tu folhas

de páginas molhadas

com ditongos meus.

 

A flor,

Amor que floresce

mergulhada no orvalho,

espalha o perfume liquido

nas margens do ser.

 

Uma loucura despida

percorre os teus braços

até libertar último gemido:

o arrebatamento final.

domingo, 8 de março de 2015

Desassossego


 
Foto: Ilona Pulkstene
 
 
As Palavras são indefesas.

Pequenas sílabas.

Seres vibrantes

que trazemos na ponta da língua.

Deitam-se para mim.

Ondulam

nas pontas dos dedos.

 

Violadas

no olhar de quem

as despe com o olhar

e as toca com uma voz sem eco.
 
 

Hálito sem sopro

de um corpo morto.

Imagens sem cor.

Espelho sem reflexo.

Desejo opaco.

Desassossego.

Caos.

Abismo.

Labirinto.

O pulsar do sangue.

A dor.
 
Lâmina.
 
O Amor.
 
A presença sem companhia.

Silêncio.

Grito.

Pedra nua.

Pétala de rosa.

 

A Palavra é a nascente.

Corre em verso.

Desagua no poema:

água essencial ao ser humano.

domingo, 1 de março de 2015

Anatomia

 
Foto: Litovkin Sergey
 
 
A noite abre a janela.

Espreita o dia.

Persegue-a até à sombra

da escuridão.

De olhos fechados,

apagamos a luz.

 

Trazemos na pele

dos dedos

os segredo carnal.

há a necessidade de enlace.

Aproxima-te.

Deslize dos lábios.

Suspiro:

o breve respirar dos enamorados.

Acelera.

 

Acaricio-te o rosto.

Busco em ti o gosto

do sangue

que em mim pulsa.

 

Através do toque

penetramos no túnel de palavras.

Mergulhamos na água

da nossa intimidade.

Rodopiamos nos gemidos

húmidos.

 

Destruímos o limite contínuo.

Beijo suave.

Beijo penetrante.

Beijo curvo.

Despiste certo

no piso escorregadio do prazer.

 

É essa a anatomia do beijo:

conseguimos deslizar

nas curvas suaves

da nudez do corpo

e da alma,

enquanto sonhamos

com algo palpável.