quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

La Vie





Foto: Paolo Lazzarotti


Beijos que entram

pela boca dentro

com o cio dos animais.



Toques que revelam

o pudor que não existe.



Fome dos animais

que se saciam com devoção

e sugam a fonte até ao tutano.



Condensa se o instinto no grito.



Desejamos a carne

sem abstinência.

Mantém se ereta

a presença da fé.

O prazer do espasmo

exorcizado pela luz do prazer.



Somos corpos abertos

e o orgasmo fica perto.

O nosso destino.

C 'est la vie.

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Festa



Foto: Colby



Trago o Deus na boca.


Agarro o terço para orar.


Com devoção


fico despida e rendida.


A cama respira.





Navegas no meu corpo


entre quatro paredes.


O que me rompe,


reconstrói-me.





O teu sabor encharca-me


a pele.


Sou apenas corpo.


O teu hálito pulsante


faz-me explodir


nas tuas mãos.





Sem pudor,


fazemos a festa.

quinta-feira, 2 de novembro de 2017

Cheguei




Cheguei sem rasgo

de lucidez

mas com a roupa rasgada.



Venho pouco católica

mas tu chamas me Maria

e eu pergunto se

queres vir a banhos.



Manténs- te assim dentro

e nada arrefece.

Vamos brincar com o fogo

que não se vê.



E eu rezo para que

te mantenhas perto.

Para manter a fé

e tudo se manter

em pé.

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Padre meu



Foto: Ruslan Lobanov


Padre meu, que estais na terra,

Santificada seja a sua presença.


Venha a mim o vosso alimento,

que trazeis debaixo da batina,

para a comunhão e consagração do meu perdão.


Seja feita a vossa vontade assim no chão

como em qualquer lugar que vos possa agradar.

O alimento que cresce em vós, me dai hoje

para as profundezas de mim.


Perdoai as minhas omissões de desejo

assim como perdoo a ausência do vosso corpo,


Deixai-me cair em tentação e livrai-me do fogo,

Amém.

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Apetite





As revoluções ocorrem

a solo,

sentados à mesa.



Na onda

do bota abaixo,

no restaurante quiseste

o aperitivo

e eu subi o vestido.



Trazia os seios envergonhados

e tu a desejar

que estivessem  destapados.



Rasgaste a roupa.

Trinchaste a pele.

Passaste a língua pelo molho.



Tremes.

Arrepio-te.

Suspiro.



Não quero os buracos

preenchidos com palavras.

Quero vácuo.

Tira-me o ar.



Vamos cair.

Gosto de catástrofes.



Sairemos ilesos

sem estarmos presos

a cartas predefinidas.



Agora podes pedir a comida.

Mas se não te faço falta,

não a peças.



Vamos abrir a noite

ou não tens apetite?

sexta-feira, 7 de julho de 2017

Por onde andas?

Foto: Anton Zhilin

Engulo o leite para crescer.

Dizem que tem cálcio.

Lavo as mãos na fonte.



Fecho as palavras dentro da boca.

Na língua está a intimidade.



Já não planto arvores.

Espero que cresçam fortes

e morram de pé.



Deito fora a alma,

agora que me expulsaste do Paraíso.

Quero saber como te soltas,

agora que me fizeste engolir tudo;

agora que me despenteaste o cabelo.



Por onde andas,

agora que tenho o diabo

no corpo? 

segunda-feira, 26 de junho de 2017

Salvar-te




Quero prender os teus gestos

no corpo

para não perder a intimidade

que trago na boca.



O peito sobe e desce.

Não caio nos braços

de ninguém.



Fazes dançar os teus

dedos em mim

e descobres o lado amargo e negro.



Fazes-me fechar os olhos.

Melodias-me.



Quero salvar-te em mim

antes que a fome nos mate.

domingo, 18 de junho de 2017

Rendes-te?




Foto: Paolo Lazzarotti

Prova-me

mas não me proves nada.



Morde-me o lábio

mas não me comas

as palavras.



Não (te) inspires.

Expira para relaxar.

Acaba a tensão.



Falha-me o chão

e eu não tenho rede.



Inventa as regras para me comportar.

Sabes, sou a exceção.

Queres dar-me a volta

mas não há volta a dar.



Faz-me suar no gelo.

Provoca-me o abismo



Não tiro a roupa.

Rendo-me.

E tu,

rendes-te?

sexta-feira, 9 de junho de 2017

Há aqui qualquer coisa



Foto: Paolo Lazzarotti

Há qualquer coisa de indecente,
quando me deito comigo.
Num jeito inocente e frágil,
desarrumo o corpo
para encontrar o que o faz vibrar
como a terra.

Há qualquer coisa de indecente
na nudez inquieta
que explode nas mãos
e me faz beber a luz
da carne
quando o eco das paredes gemem.

Há qualquer coisa no contorno
incerto das coisas.

Se ficares, ensina-me a cair.
Se (te) vens, ensina-me a voar.

Eu não sei…..
mas há aqui qualquer coisa.

sexta-feira, 2 de junho de 2017

Se



Se surgir em flor
podes desfolhar-me.

Se surgir como areia,
não te metas comigo.
Mete-te dentro de mim
feito mar que se enrola
de fora para o in(fim)nito.

Se surgir feita caravela
e começar a divagar demais,
coloca-me a mão no ombro
e não me faças ir por viagens banais.

Se surgir como cobra,
descama-me mas não me dispas.
Agarra-me pela ponta dos cabelos
e ficarei no fio da navalha,
logo que tragas a adaga
e me deite na parede.

terça-feira, 23 de maio de 2017

O que trazes contigo?




Foto: Paolo Lazzarotti

O que trazes contigo, hoje?

Os aromas são sabores que desconheço.

Passas por mim

e não te conheço.



Nao faças caso de mim à noite.

Faz de mim um caso teu

todos os dias.

Juro que não me caso,

caso nada aconteça.



Que sabor trazes contigo?

Quero saber.

O que trago,

eu não digo.



Escorre um suor noturno

e algo palpita no coração

da flor.

É exato.

Mecânico.



Viverei com isso até à morte.

Para saberes como palpita,

descobre o instinto guloso

que bombeia o desejo.



Diz que me matei,

quando recolheres a minha vida

expirada no teu colo.

Serei a menina

com instintos fatais.



Afinal, o que trazes contigo?

domingo, 14 de maio de 2017

Olha só




Olha só,

sou uma gata

que anda nos telhados

a fazer versos para a lua

e que pede desejos

às pessoas na rua.



Olha só,

Sou uma cobra

que trocou de pele,

deixando-a no chicote

das tuas mãos.



Olha só,

trago palavras

dentro de beijos.

Tenho estado em

silêncio.



Olha só,

sou um anjo

a quem prendeste os pés

e pediste que voasse.

Deixei-te sozinho

Sem ter partido,

regressando devagarinho.



Olha só,

o que te digo não é erótico.

Não é sensual.

Retira a pontuação.

Retira a roupa.

Acabou o mundo.



Os anjos não têm sexo.

(Nunca se sabe o que virá

depois.)

domingo, 30 de abril de 2017

Arte




Axel L.

Ando às voltas.

Descubro o corpo.

Sinto.

Percorro.

Invado.



Rasto viscoso

de fome.



A verticalidade

estrangula-me.



Empurro-me

contra o punhal.



Afinal,

quando as pernas

se abrem

como um cavalete,

a arte nasce.


sábado, 22 de abril de 2017

Cai mas não tropeces



Foto: Axel L.

Senta-te na mesa.

Temos de falar.



Pouso as mãos

nos teus joelhos

e digo te que sim.



Dispo-me a preceito

e coloco-me a jeito.



Queres que arda na tua fogueira

mas só acontecerá

de uma maneira:

Trazes a vela para festejar?



Porei os lábios onde quero.

Néctar.

Vou e volto.

Atinjo-te.



Com graça animal.

Faço-me bicho da terra.



No inferno

há sempre uma fonte

sempre a pingar.



Se a vela se mantém

acesa,

alguém tem de a apagar.



Enterra-a nos confins da terra.



Descobre o desejo

na gota de água.



Cuidado!

Não tropeces

no meu corpo.



Cai…………

na tentação da carne

que não levas.