sábado, 27 de janeiro de 2024

Palavras do corpo



 Já não há nada a dizer.

O gesto conta uma história
Numa linguagem sem palavras.
Apenas os dedos rosnam.

Os pássaros traçam escuros voos.
Procuram um fruto para morder.
O odor emerge das raízes 
Das árvores que se pretendem
 abraçar.
Há fogueiras junto aos lagos.

Sustém a respiração:
O corpo não fica à superfície.
Fá lo regressar
Para o refúgio dos teus dedos
Proclamando o seu nome
no arrepio da manha.

Hoje afinal, tenho algo a dizer:
Não são palavras ridículas:
São as palavras do corpo. 

domingo, 21 de janeiro de 2024

Desejo velado

 



A menina do outro lado

Vive na rua do quadrado .
Olha para o calendário
Que não lhe diz a idade.

Bate com a cabeça nas esquinas
Encurralada por paredes solitárias .
Esqueceu as curvas da existência.

Encontra se em dias de sol
Quando olha as paredes
E vê o chão que pisa.

Tropeça nas interrogações
Recolhe os pedaços
Para ver o que está errado.
Mas ela vê mal.
Está tudo desfocado.

A coragem vem quando
A terra treme debaixo dos pés
E se salta para o abismo
Para se ver a luz.

Há rostos vivos que a reanimam
Quando ela teima 
em pousar a cabeça
Nos fantasmas familiares.

Volta a respirar
No buraco negro sem tempo
Sem espaço
Mas com marcos de memória.

Se a noite terminar,
Não estará sozinha.
Pode dormir tranquila:
O desejo de voltar
Vela lhe o sono.