sábado, 27 de maio de 2023

A Bandida

 




Apanhar uma bandida

que encontrou um quarto

com tendência para ser minguante,

faz pensar que no céu não há lugar

para muita gente.

No final,

mais vale ter uma bandida

(do pomar) ao lado

e beber o que de melhor

a fruta da tentação

tem para oferecer.

 

Por isso,

ter uma bandida ao lado

nada de mal tem.

Refresca te o corpo

e aclara-te a alma  

com um beijo gelado nos lábios.

domingo, 14 de maio de 2023

Finis Terra


 

Vi as minhas margens nuas

e na sombra, curvas claras.

Doeu o ar que inspirei

e custou me a simples expiração.

 

Não quebrei as esquinas

e pelas janelas

(do olhar)

entraram as primeiras luzes.

 

Trouxe apenas a solidão

das mãos cheias de nada.

Arranquei as palavras com raízes

numa casa onde habita o teu nome.

 

Procurei aquele ditongo que ecoa

nos dias entardecidos

apenas para me

deixar engolir pelo buraco negro.


Jurei ser eu

e ter o poder de

flutuar sem tirar os pés do chão.

 

quis apenas que me mostrasses

a beleza da morte de uma estrela.

 

Cheguei ao meu destino:

finis terra.

Nada terminou.

Para lá da fronteira

ainda há caminho.

sábado, 6 de maio de 2023

Anda à noitinha

Anda à noitinha porque

não te quero encontrar

à luz do sol para que 

não haja um vazio entre nós 

e uma sombra aos pés.


Anda à noitinha para podermos encontrar

uma resposta sem ter

o chão debaixo dos pés.


Anda à noitinha

porque não quero escrever-te um bilhete

e as palavras leva-as o vento.

Deixa o silêncio do gesto falar por nós.


Anda à noitinha

porque ando perdida pela casa

e há uma vontade  que ondula nos ossos.


Anda à noitinha 

porque das entranhas da terra

emergem as labaredas enterradas 

nas profundezas do solo

e tu trazes o vento nas mãos.


Estou perdida, por isso,

anda à noitinha.

domingo, 30 de abril de 2023

O beijo

 


À mesa ha sempre 

Um lugar vazio. 


As palavras são as mesmas

mas perdi o fio á meada.

Peguei na roca

para fiar.

Piquei me e adormeci. 


A beleza do silêncio 

deixou me  embalsamada

entre 4 tabuas

sem fuso horário, 

Sem tempo. 


Agora levanto me

E deito estas palavras em lençóis de linho

Para que estas sejam 

Beijos nos lábios dos

Leitores.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

Desejos secretos


Foto: Ana Pereira 


Precisas de um céu aberto;
Árvores altas;
Rios que correm sempre para Sul
e que matam a sede das almas
que vagueiam pela terra.

Deixar as velas arder.
Agarrar os ossos.
Devorar a carne.
Sentir o sabor.
Apurar os  ouvidos.
Deixar subir as chamas do inferno.

Acredita que há pecados com perdão. 
Inocentemente cair na tentação.

Apela ao senhor
que te conceda o que desejas
com todo o fervor.

Aprende a contar 
com calma
até 69.
Repete oralmente.

Confia.
Quando o souberes, 
saberás navegar e 
satisfazer todos os 
desejos secretos. 

sexta-feira, 11 de outubro de 2019

Ondulação




Foto: Ana Pereira 



No fundo da colina

há um rio.

Enrolo-me nos teus dedos
e rodopio contigo.

Aprendes a saborear
as coisas por dentro.

Dizes-me baixinho:
Pertences-me indefesa
quando a minha mão
ondula em ti.

sexta-feira, 27 de setembro de 2019

ENIGMA


Amei os teus pulsos
e suportei tudo
quando me deste a mão.

Vesti te de cetim
e o teu corpo
escorregou até mim.

Trazias os braços abertos
para que caisse
em ti.

Bebi de ti
as neblinas
E nas minhas mãos
Ficaram todos os sons do teu corpo
Sem nome.


Foto: Ana Pereira

segunda-feira, 26 de março de 2018

Pede-me





Pede-me um beijo

para soltar o desejo

do teu corpo.



Pede-me um copo

para que possas matar a sede

e eu possa enchê-lo depois.



Pede-me uma cama

e terás um abraço

para colmatares o teu cansaço.



Pede-me o sol

enquanto a mão

desliza como um rio.



Pede-me o que quiseres

mas não portas a louça.

Deixa todos os teus desejos

no silêncio dos deuses.

Mistério



Foto: Tony Schuller 


Sabes que eu posso

tornar-me uma predadora mesmo

quando me movo em areias movediças.



Sabes que eu posso desabotoar-me

mesmo quando sou submissa

e esfaqueada pela espada  de palavras gemidas.



Sabes que a pele é espaço de poesia

onde o vento arrepia e faz sentir o

peso do erotismo.



Sabes que não podes encontrar-me

quando me deito, abandono.

Torno me volátil.

Viciante.

Um mistério de mulher.


quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

Aproxima-te




Foto: Tony Schuller 

Tenho a mão atrevida.

Não sou eu a dominada

mas quem domina.

Sou uma menina.



Respondo ao teu apelo.

Perco me de madrugada.

Já tanto tempo faz

que procuro o teu reflexo dentro

com o leite aceso,

espuma do mar,

na concha da boca.



Debaixo dos caracóis

dos meus cabelos,

procuro o teu mundo.



Chega mais perto para te ver

e comer

com os olhos fechados.

segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

Grita comigo




Foto: Michael Haufmann

Procuro o tronco incendiado

Que traz consigo

As raízes e as asas.



Todos nós nos tornamos

Frutos noturnos

Comestíveis.



E a tua fome

Faz me desaparecer

Como madeira seca

A arder.

A tua sede

Faz me derreter

Quando mergulhas

A boca na virtude.

Tiras me o céu

Do corpo.



Fico nua e crua.



Tenho medo

De comer

E enlouquecer.



As nossas conversas

são gritos em uníssono

com muito prazer.



Por isso,

grita comigo.

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

La Vie





Foto: Paolo Lazzarotti


Beijos que entram

pela boca dentro

com o cio dos animais.



Toques que revelam

o pudor que não existe.



Fome dos animais

que se saciam com devoção

e sugam a fonte até ao tutano.



Condensa se o instinto no grito.



Desejamos a carne

sem abstinência.

Mantém se ereta

a presença da fé.

O prazer do espasmo

exorcizado pela luz do prazer.



Somos corpos abertos

e o orgasmo fica perto.

O nosso destino.

C 'est la vie.

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Festa



Foto: Colby



Trago o Deus na boca.


Agarro o terço para orar.


Com devoção


fico despida e rendida.


A cama respira.





Navegas no meu corpo


entre quatro paredes.


O que me rompe,


reconstrói-me.





O teu sabor encharca-me


a pele.


Sou apenas corpo.


O teu hálito pulsante


faz-me explodir


nas tuas mãos.





Sem pudor,


fazemos a festa.

quinta-feira, 2 de novembro de 2017

Cheguei




Cheguei sem rasgo

de lucidez

mas com a roupa rasgada.



Venho pouco católica

mas tu chamas me Maria

e eu pergunto se

queres vir a banhos.



Manténs- te assim dentro

e nada arrefece.

Vamos brincar com o fogo

que não se vê.



E eu rezo para que

te mantenhas perto.

Para manter a fé

e tudo se manter

em pé.

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Padre meu



Foto: Ruslan Lobanov


Padre meu, que estais na terra,

Santificada seja a sua presença.


Venha a mim o vosso alimento,

que trazeis debaixo da batina,

para a comunhão e consagração do meu perdão.


Seja feita a vossa vontade assim no chão

como em qualquer lugar que vos possa agradar.

O alimento que cresce em vós, me dai hoje

para as profundezas de mim.


Perdoai as minhas omissões de desejo

assim como perdoo a ausência do vosso corpo,


Deixai-me cair em tentação e livrai-me do fogo,

Amém.

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Apetite





As revoluções ocorrem

a solo,

sentados à mesa.



Na onda

do bota abaixo,

no restaurante quiseste

o aperitivo

e eu subi o vestido.



Trazia os seios envergonhados

e tu a desejar

que estivessem  destapados.



Rasgaste a roupa.

Trinchaste a pele.

Passaste a língua pelo molho.



Tremes.

Arrepio-te.

Suspiro.



Não quero os buracos

preenchidos com palavras.

Quero vácuo.

Tira-me o ar.



Vamos cair.

Gosto de catástrofes.



Sairemos ilesos

sem estarmos presos

a cartas predefinidas.



Agora podes pedir a comida.

Mas se não te faço falta,

não a peças.



Vamos abrir a noite

ou não tens apetite?

sexta-feira, 7 de julho de 2017

Por onde andas?

Foto: Anton Zhilin

Engulo o leite para crescer.

Dizem que tem cálcio.

Lavo as mãos na fonte.



Fecho as palavras dentro da boca.

Na língua está a intimidade.



Já não planto arvores.

Espero que cresçam fortes

e morram de pé.



Deito fora a alma,

agora que me expulsaste do Paraíso.

Quero saber como te soltas,

agora que me fizeste engolir tudo;

agora que me despenteaste o cabelo.



Por onde andas,

agora que tenho o diabo

no corpo?